por Elizeu Gomes
Uma das culturas que permeiam nosso
meio e já dura décadas, é ver a frustração de alguns pastores que percebem que
seu trabalho durou apenas enquanto ele esteve na liderança daquela igreja. E a
motivação que liderou todo processo, foi por água abaixo com a chegada do
“novo” ou do "outro" pastor.
Todos nós vemos a situação quando um
pastor deixa sua igreja e seus objetivos, sua visão saem de lá com ele também. Peca-se
demais quando alguns pastores não tem a humildade de dar continuidade ao
trabalho de um colega, e a isto eu chamo de "Síndrome dos Assírios”. Por quê?
Remetendo-se à história, muitos
impérios passaram pela face da terra, entre eles, por exemplo, o Babilônico,
que quando conquistava os povos, trazia cativos os líderes, levava as mentes
pensantes, e deixava nas nações os costumes, a língua, a cultura e o código de
leis. No entanto, ao contrário dos Babilônicos, os Assírios, quando
conquistavam uma nação, destruíam tudo que viam pela frente, faziam uma
devastação sem precedentes, para não deixar vestígios que um dia um povo
anterior ou nação se quer existiu. Eles tinham prazer em acabar com tudo. Eram
temidos pela forma brutal com que matavam e exterminavam seus inimigos. Por
conta deste infame comportamento a humanidade perdeu gloriosos registros e
documentos importantes, fora obra de artes, etc.
Pois bem, hoje em dia vemos claramente
isto acontecer exatamente na transição pastoral.
O pastor que está saindo elaborou
tantos sonhos, lutou, orou, suou a camisa, investiu e cumpriu boa parte do
projeto (se não todo), o povo local foi envolvido, algumas pessoas abraçaram a
causa e colocou sua paixão, coração; a igreja desenvolveu um tipo de
identidade, foi de certa forma mobilizada. Todavia, quando chega o novo pastor
(especialmente os Assírios), ele tem o prazer de apagar tudo o que o outro
construiu. É aquela famosa ilustração onde as pessoas não querem colocar a
azeitona em cima da empadinha dos outros.
A psicóloga Arlete Gomes afirma que um
adulto para se autoafirmar precisa ter vivido uma experiência traumática que o
fez sentir-se ignorado, rejeitado, esquecido ou colocado em algum lugar
inferior. Após viver todos esses percalços, esse adulto não teve condições de
superá-los. Sendo assim, ele tornou-se incapaz diante dos valores e das
expectativas sociais. Por este motivo, a autoafirmação é manifestada como uma
necessidade muito forte de se firmar diante dos outros, afinal, ele quer ser
aprovado, reconhecido, elogiado. Essa necessidade de exaltação faz com que esse
adulto deixe de olhar para dentro de si, ignorando que é no seu interior que se
encontram os reais motivos que irá induzi-lo a parar de almejar o
reconhecimento.
A motivaçao destes “pastores assírios”
é má, seu interesse não é o reino de Deus e sim seu “reino pessoal”, sua índole
não é inclinada ao sentimento em que “todos podem somar na individualidade e
comemorar na coletividade”, não mesmo, eles querem “reinventar a roda” para dizer:
“fui eu e não ele...”, eles idealizam uma comemoração “para sí”. São pedantes,
arrogantes, "interesseiros" e cada ação comprova sua incapacidade.
A incapacidade promove uma luta
desenfreada pela auto afirmação de identidade pastoral.
Por falta destes pastores em dar continuidade aos processos que
foram sucessos comprovados (eles não conseguem reconhecer porque a mediocridade
os cega), a igreja local sente, a mesma igreja sofre, perde-se pessoas e a obra
de Deus atravanca porque o Espírito Santo se entristece com esta forma de
realizar o ministério pessoal.
Minha primeira igreja como pastor
titular foi em Caruaru, PE. Eu era um pastor jovem, recém-formado, cheio de
apostilas e livros tipo: “Como fazer para ter a maior igreja do mundo...” Cheguei
mudando tudo e apagando tudo o que fosse possível do pastor Euclides, que era o
pastor anterior (hoje me lembro de sua feição de tristeza, e isso me dói). Mudei
o nome de cultos, horários das reuniões, reloquei os dias dos eventos, pintei o
salão, comprei equipamentos, tudo em cima da infame frase: “pastor novo, vida
nova”. Como se diz no popular: “deu ruim”. A frequência caiu, as entradas
minguaram e o silêncio foi letal. Foi drástico aquele momento, era a minha
primeira igreja.
Rapidamente, quando me vi em apuros,
liguei para o SD, que na altura era meu pai, Pr. Manoel Murilo Gomes e lhe
contei a tristeza do meu primeiro impacto como pastor titular. Papai, era um
pastor experiente, na época com 30 anos de ministério, sorriu e me disse:
“Filho, eu me esqueci de te aconselhar. A melhor forma de assumir uma igreja é
chegar e perguntar: “Como vocês dançam aqui?” e aí você dança com eles, mesmo
que não seja a sua dança, até que eles sintam que você se interessou pela dança
que eles já estavam acostumados a dançar. Desta forma, você vai ganhar a
confiança deles e ai vai chegar o momento, isto é natural e rápido, em que eles
vão te perguntar: “pastor, e aí, qual é a sua dança?” então, você pode fazê-los
dançar a sua música”.
Pastor que chega numa igreja apagando
tudo e implantando sua dança, vai magoar pessoas, ferir outras e entristecer a
Deus. Recomece, tente saber o que está terminado, ou em construção, ou que você
mexeu que era importante para eles, busque recolocar “o que era do outro
pastor”, faça o povo saber que você respeita a liderança passada, embora você
saiba que a sua é bem “melhor”. Confesso que foi a minha salvação, e logo
depois de 4 meses a igreja estava nos passos da minha dança.
Na transição, dar continuidade no que
você encontrou, não significa anular sua vida e ministério, porque o que você é
ou o que você tem, se é algo que Deus lhe entregou, nada e ninguém vai arrancar
de você. No entanto, Deus tem o momento certo para que tudo isto possa aflorar.
Não se engane! Neste “progresso
assírio” uma coisa pior pode acontecer: a igreja te interpretar como arrogante
e soberbo; aí será o fim, e pra recuperar, a demora vai ser grande. Uma vez li
uma frase: “Não reclame do que você encontrou, porque quando foi feito você não
estava aqui para participar”.
Se você deseja ser um pastor humilde,
se você almeja ser um pastor que todos amem e gostem, por favor, respeite os
marcos antigos, valorize onde as pessoas deixaram seus corações, aos poucos
receba o reconhecimento do povo e assim você poderá fazer igual aos Babilônicos
(se isto foi uma das coisas boas que eles deixaram), mudar os paradigmas, e
mudança de paradigmas constrói uma visão inabalável.
Respeite seu colega que saiu e não
tenha medo de colocar azeitona na empada dele, afinal, ambos trabalham para o
mesmo Rei e Reino, não é mesmo? A glória não é sua e nem do outro pastor,
embora os méritos sejam de ambos, mas a Glória é de Deus que a todos recompensa
segundo seu trabalho. Assim você terá a melhor e a maior igreja, enquanto firma-se
como o melhor e maior pastor de todos os tempos para aquele povo.
Dar continuidade ao trabalho, suor,
esforço e paixão do colega antecessor não significa anular sua visão pessoal e
sim, respeitar, honrar, reverenciar o serviço que seu antecessor deixou como
legado e a partir dai Deus dará a oportunidade de estabelecer uma igreja maior
e melhor, onde as pessoas entendam que o ministério é realizado por obreiros
que possuem o mesmo objetivo enquanto trabalham de forma diferente.
Como eu viajo bastante e sou
conferencista, encontro muitos pastores tristes no período de seis meses após
os concílios, porque o primeiro semestre após as nomeações é o tempo em que os
“pastores assírios” destroem tudo o que os outros deixaram para se auto
promoverem e chegarem “bombando” na sua estreia. O lado ruim é que vejo alguns
colegas cabisbaixos dizendo: “dei meu sangue naquele projeto, sacrifiquei minha
família, naquela causa, muita coisa deu certo e o amigo lá mudou tudo e apagou
tudo, trocou nomes, etc”. Nesta hora, tudo o que faço e abraçar e consolar
colega porque eu já passei pela mesma experiência e sei como dói.
Certa vez, meu amigo, o cantor
Dilardino Ferreira, me lembrou do costume dos Leões que ao conquistar a fêmea
do leão rival, mata os filhotes. A escritora Maria Ramos, em seu blog: “Toca da
Leoa, vida de leão” diz: “Tirando a visão romântica tipo "Rei Leão",
as leoas não precisam de um par para sobreviver. Elas são capazes de caçar e de
se sustentar. Elas defendem os filhotes e são sociáveis. Elas formam grupos e
dividem as tarefas. O leão só se junta ao grupo para "dominá-lo".
Você já deve saber que quando há "troca" de leão dominante, o novo
macho mata todos os filhotes para que as leoas entrem no cio; eles, na verdade,
estão mais interessados em ter um território e ter fêmeas que os
alimentem".
Veja o exemplo de João Batista: “eu vim
preparar o caminho...” João não tinha problema em colocar “azeitona na
empadinha de Jesus” (desculpe o colóquio), o próprio Jesus deu honras a João e
ainda disse: “eu vim fazer as obras do meu pai”. Há pastores que dizem com suas
ações: “eu vim destruir as obras do meu antecessor”. Bom, fiquemos com a
mensagem dAquele que nos envio de fato: “Para que todos sejam um, como tu, ó
Pai, o és em mim, e eu em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo
creia que tu me enviaste” (João 17.21).